Artigo publicado na Revista “Manufatura em Foco” – por Nortegubisian.
Como Implantar?
Essa é uma das perguntas mais recorrentes aos administradores de produção nos dias de hoje e a melhor resposta é encontrar um método eficaz que dê suporte ao processo decisório e oriente o plano de melhorias.
No número anterior de “Manufatura em Foco”, abordamos a importância de realizar eventos Kaizen orientados pelo mapeamento do fluxo de valor.
Esta forma de atuação garante que as melhorias ocorram nos pontos críticos do processo, e que os resultados sejam mais rápidos.
Neste artigo, apresentaremos como realizar eventos Kaizen, para que os resultados obtidos sejam permanentes e contribuam para a criação de uma cultura organizacional de busca constante por novas oportunidades.
Para isso, é necessário, antes, caracterizar adequadamente os tipos de melhoria que podem ocorrer nas organizações. Segundo Nigel Slack (Administração da Produção, Ed. Atlas), a melhoria de processos em uma organização pode partir da adoção de dois tipos diferentes de modelos:
- Melhoria contínua, caracterizada por pequenas e constantes mudanças incrementais nos processos existentes;
- Melhoria radical, caracterizada pela ruptura com o processo atual e sua substituição por um novo processo completamente distinto do anterior e “reprojetado” (redesigned process).
Os precursores da BPR, Mike Hammer e James Champy (“Reengenharia”, Ed. Campus), têm restrições quanto à validade de utilização deste ciclo, pois consideram que a etapa “As-Is” não deve ser realizada sob o risco de “contaminar” o novo processo por ideias já existentes, possivelmente presentes no processo atual (existente) de execução.
Além desta classificação, deve-se considerar também a possibilidade de realização das chamadas “ações de ganho rápido”, conhecidas por “quick wins”, “quick kaizens” ou RIE (Rapid Improvement Event). Estas ações possuem características distintas das anteriores. São identificadas quando o mapeamento de processo é iniciado e percebe-se a ocorrência de atividades duplicadas, erros, ações fora dos padrões estabelecidos, processos inadequados, ou seja, situações que podem (e devem) ser rapidamente corrigidas, com gastos mínimos (geralmente, treinamentos pontuais) e resultados rápidos.
Muitas vezes, são simples correções de erros operacionais. Por isso, não são categorizadas como um tipo de melhoria específico, uma vez que são resultados de trabalhos de acompanhamento de atividades, componentes dos processos que se planeja melhorar. A escolha do tipo de modelo de melhoria que se planeja implantar depende da análise de uma série de fatores. A tabela 1 apresenta uma síntese das características de cada modelo, de forma a auxiliar a tomada de decisão. O tempo necessário para geração de resultados, a capacidade de investimentos, os riscos envolvidos e os resultados obtidos são alguns dos fatores a considerar para a decisão.
A maior parte dos programas corporativos de melhorias apoia suas ações no modelo de busca contínua e permanente por resultados.
As ações de melhoria contínua, por sua vez, devem pautar-se em dois aspectos fundamentais para garantir seu sucesso:
- Utilizar um método estruturado robusto de implantação;
- Garantir a manutenção dos resultados obtidos ao longo do tempo.
Eventos de Melhoria (Kaizen): Estrutura para Implantação
Nenhuma estrutura para implantação pode garantir que os resultados de ações de melhoria sejam plenamente atingidos, mas, certamente, a ausência de uma estrutura adequada pode comprometer o trabalho e prejudicar os resultados.
Masaaki Imai, considerado o precursor dos eventos Kaizen, avalia que o denominado “passo zero”, ou seja, a preparação do evento ou “pré-work” é a etapa-chave para garantir chance efetiva de sucesso.
Os passos para a realização de eventos Kaizen estão comentados a seguir.
1) Preparar o evento
Na etapa de “pré-work”, são realizadas as seguintes atividades:
– Definir o time (equipe responsável): componentes, ações e responsabilidades de cada membro;
– Escolher a área/processo da empresa onde a ação será implantada;
– Preparar planilhas e documentos que serão utilizados para coleta e análise de dados;
– Prover os recursos necessários para a realização do evento (material, tempo, agenda);
– Delimitar o escopo de atuação (o que faz parte e o que não faz parte) dos objetivos do evento;
– Selecionar os indicadores de desempenho que serão utilizados para avaliar se os resultados planejados serão alcançados;
– Estudar eventuais desdobramentos das ações planejadas (atividades pós-evento). De modo geral, a qualidade de execução destas atividades é determinante para o sucesso do evento e para o atingimento dos resultados. O apoio de um profissional de gestão de projetos é altamente recomendado nesta fase.
– Definir o objetivo e a meta dos resultados planejados concretiza-se através do estabelecimento de metas para os indicadores de desempenho selecionados. O histórico de desempenho do processo em análise e o levantamento de dados realizado na etapa anterior auxiliam na definição das metas.
O estabelecimento de metas muito agressivas pode gerar frustração (caso não sejam atingidas) ou motivar comprometimento da equipe em relação à continuidade dos eventos. Trata-se de uma questão polêmica, pois depende de um esforço de previsibilidade nem sempre possível.
Embora a definição das metas para os indicadores de desempenho geralmente seja definida através da análise de padrões históricos de performance, outras possibilidades podem ser exploradas.
2) Treinar a equipe
Os componentes da equipe de melhoria precisam: conhecer o processo em análise, suas características principais e de capacitação para atuar no evento. Informações prévias sobre os participantes (skill, expertises) são muito importantes. Matrizes de treinamento obtidas nas áreas de RH e utilização de multiplicadores internos para suprir carências de membros da equipe podem auxiliar nesta etapa. O uso das planilhas, a familiaridade com os indicadores, o conhecimento de métodos e ferramentas de análise e solução de problemas são cruciais para o trabalho.
3) Conhecer o problema
Quanto maior o nível de conhecimento anterior sobre o processo a ser melhorado, maior a chance de sucesso do evento Kaizen.
Em grande parte das vezes, as soluções já foram delineadas no “pré-work” e a ocorrência do evento em si garante a mobilização da força de trabalho necessária para viabilizar sua implantação.
Este é um dos “segredos” dos eventos Kaizen para garantir a obtenção dos resultados planejados: em linhas gerais, as ferramentas de ação sobre as oportunidades de melhorias já foram identificadas e estudadas na fase do “pré-work” e, assim, a ênfase do evento é a implantação das ações.
Matrizes A3 e mapas de estado atual do processo em análise são ferramentas de suporte fundamentais nesta etapa.
4) Registrar a performance
Nesta etapa do trabalho, deve-se:
– Medir desempenho do processo, tanto utilizando os indicadores de desempenho tradicionais da organização, como necessitando “criar” indicadores específicos, que serão utilizados durante períodos predeterminados de tempo, focados no monitoramento dos resultados do evento;
– Registrar o processo, usando os recursos disponíveis (filmagem, fotos, crono-análise, gestão à vista, ferramentas da qualidade);
– Documentar a realização do evento, usando formas padronizadas de relatórios de status, para formar um “banco de dados” sobre os eventos Kaizen realizados na organização e que possam ser acessados, no futuro, por profissionais de todas as áreas de atuação, para identificação de novas oportunidades ou busca de soluções já adotadas em casos similares.
5) Gerar melhorias
É a etapa principal do evento Kaizen, na qual:
– São geradas e testadas alternativas de solução;
– Resultados são monitorados diariamente e ações são desdobradas em função deles;
– Rotinas diárias de acompanhamento são realizadas;
– Reuniões de curta duração no início e final de cada dia de trabalho avaliam a evolução das tarefas.
6) Priorizar as ações
Ao final da execução, por melhor que tenha sido o planejamento e a gestão do projeto, algumas atividades podem não estar finalizadas. Isto exigirá um esforço da equipe em identificar as pendências e preparar o “kaizen newsletter”: a relação de atividades que faltam e um cronograma para sua execução.
Até mesmo um novo evento pode ser planejado, em função do montante de ações por realizar.
7) Implantar e monitorar
Mapa A3 – Manufatura Celular.
Nesta fase, avalia-se a estabilidade dos resultados, a manutenção dos indicadores nos novos patamares alcançados e programam-se as auditorias. As auditorias garantem o monitoramento constante das ações implantadas, de modo a avaliar a continuidade dos resultados.
Avaliação dos Resultados Obtidos
Ao final de cada evento, um cuidado especial com a documentação das atividades realizadas deve ser dispensado.
Grandes empresas transnacionais, com escritórios de melhoria contínua bem estruturados, possuem recursos de intranet que permitem acesso a projetos de melhoria desenvolvidos em várias unidades e que podem ser acessados por colaboradores em qualquer parte.
Este acesso a informações sobre projetos já realizados, ações em andamento, cases de sucesso e experiências frustradas pode auxiliar muito a potencializar os recursos das equipes de melhoria e acelerar a obtenção de resultados.
Também é importante destacar que eventos Kaizen, embora tenham sido originalmente desenvolvidos para melhorar o desempenho de processos produtivos, podem (e devem) também ser utilizados para a melhoria de processos de apoio ou administrativos.
Esta tendência (que conhecemos por “Kaizen Office”) tem aumentado significativamente nos últimos anos tanto nas organizações de manufatura (nos processos de apoio à produção), como nas organizações de serviços.
No próximo número de “Manufatura em Foco”, abordaremos como gerenciar as mudanças que os eventos Kaizen provocam nas organizações e processos e como evitar (usando uma expressão típica do chão de fábrica) que as iniciativas “escorreguem”.
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